domingo, 15 de março de 2009

Artesão no Sereno .[em "Faz escuro mas eu canto", de 1965, de Thiago de Mello]

Não convém embrulhareste brinquedo feitode amor. Pode estragar,pode mudar de cor,mudar de rumo, deixem,que ele precisa de ar.E de resto ele foifeito para meu filhoque é pessoa singelae sensível, não vaigostar de ver orvalhoe ternura embrulhados.Feito para o meu filho,pode ser para o filhode qualquer um, por issonão convém que ele sejalevado em mão ao dono,que não tem pressa; um dia,os correios do ventoacharão sua casa.Este brinquedo podee pede levar sol.Mal sol da manhãzinha.O da tarde não serveporque altera os azuis.Não disse o azul geral.Sei a que azuis refiro,sei que azuis usei.Brinquedossão peças mui delicadasde um modo geral, até osnobres cavalos que pobrescrianças tiram de vassouras.Quanto mais esses brinquedosque devem, depois de feitos,ou para que fiquem feitos,adormecer muitas noitesno sereno da janela.Só quem fabrica é quem sabe(ou então não sabe nunca)as infinitas maneirase desmaneiras do ofício,a total falta de leipara compor o mais simples,se é que todos não são simples,desses brinquedos de amor,feitos de tudo, inclusivede palavras que, ao finalde contas, são o de menos.Mas não sei de teorias,minha vida é fabricaro que não sei, fabricandoo amor no amor por amordos brinquedos, meus brinquedos,ai, meu Deus, vou trabalhar,que o sereno hoje está bom

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