Ele descartou da seleção ídolos como Ronaldinho, ele coloca praticidade e objetivo no lugar de futebol arte. O treinador Dunga, que a imprensa crítica do Brasil chama de "O Alemão", quer trazer o título mundial com um trabalho de valor e de eficiência.
Os torcedores, no entanto, acham que a sua seleção se afastou deles.
Pouco antes da partida para a África do Sul, acontece uma recepção no palácio presidencial para os jogadores da seleção nacional. Os jogadores ficam numa longa fila diante de Lula. Ele dá um aperto de mão e sussurra uma recomendação para cada um deles. Os flashes espoucam.
Se esta cena não se passasse na palácio presidencial, poderia-se imaginar o Papa dando a sua benção "Urbi et Orbi".
E, de repente, o rosto de Lula se torna sisudo. O treinador Dunga fica em pé a um metro do presidente e lhe estende a mão. Dunga, 46 anos, não aprecia intimidade e muito menos compromissos oficiais como esse, principalmente quando esses compromissos são determinados apenas dois dias antes e, com isso, atrapalham totalmente os planos de treinamento. Dunga também não se simpatiza muito com políticos, pois eles "apenas falam aquilo que as pessoas querem ouvir", diz ele.
A seleção se qualificou de forma soberana para o mundial na África do Sul, ganhou a Copa das Confederações, se preparou muito bem e não há contundidos no time.
Apesar disso, o ânimo da pátria está ofuscado. Os torcedores não acreditam muito que os heróis venham a trazer a taça.
Não tem nada a ver com a qualidade do plantel. A seleção se compõem de 23 jogadores altamente técnicos. No entanto, o povo não se sente ligado a essa seleção. O time foi um dos primeiros a chegar na África do Sul. Dunga os isolou o quanto foi possível. Ele não quer que a ocasião se transforme num circo, como o foi em copas anteriores, nas quais repórteres e torcedores passeavam folgadamente no local de treinamento sempre que quisessem.
Os seus críticos mais ferozes estão hospedados num hotel perto do centro esportivo. A TV Globo, o gigante da mídia brasileira, enviou um exército completo de repórteres para a África do Sul. A Globo é uma alta potência no Brasil, com TV, jornal e portais na Internet. Duas coisas são básicas aos brasileiros além do futebol: a família e a televisão. A Globo, com sua telenovelas, shows e reportagens esportivas, decide e determina quando o povo deve sorrir ou chorar. Alguns repórteres são tão famosos em sua pátria quanto Pelé ou Gisele Bündchen.
O treinador que tiver a Globo como inimiga, terá uma vida muito difícil como técnico da seleção.
Mauro Neves não precisou pensar muito para informar porque os brasileiros não amam esse time. "É tudo culpa do treinador" diz o repórter da TV Globo. Os colegas concordam com a cabeça. Eles chamam Dunga de "o alemão" porque ele sempre é muito correto, planeja tudo, não suporta bajulação e barra a mídia. "Ele não gosta de nós, o alemão, ele não gosta de ninguém", diz Naves.
Carlos Dunga se chama na verdade Carlos Caetano Bledorn Verri. Ele ganhou o apelido de "Dunga" porque, quando criança, era muito pequeno. Seus avós vieram da Alemanha.
Ele era capitão da seleção em 1994, quando ganhou a copa. Dunga foi o "destruidor e limpador" na defesa, jogando sempre de forma objetiva. Também jogou durante dois anos na liga alemã pelo Stutgart.
O jogo da seleção atual, sob o comando de Dunga, não é mais tão ofensivo como antigamente. Sob o seu comando a seleção joga de forma controlada, eficiente e, poderíamos até dizer, de forma moderna. Ídolos como Ronaldinho, Ronaldo e Roberto Carlos foram descartados do plantel. O único que ainda ficou é Kaká, do Real Madrid.
Os torcedores estão decepcionados. Eles queriam ver seus antigos heróis jogar. Os protestos contra a reforma de Dunga aumentaram principalmente depois que ele barrou Adriano, um dos jogadores mais apreciados no Brasil
Dunga fecha os olhos e diz: "Eu não estou aqui para agradar quem quer que seja. No Brasil o futebol é amor. E o amor transita entre o ódio e a paixão".
Há dois anos, o jornal "O Globo" pediu a demissão de Dunga por ter perdido a semifinal olímpica contra a Argentina. Nas suas caricaturas, o jornal colocou um aviso: "Pede-se não enviar flores".
Dunga sobreviveu a isso, contando com apoio da CBF. E agora é a Copa do Mundo.
Não há espaço para perdão.
Dunga se considera um reformador. Às vezes ele formula frases que são tão francas e claras em sí, que os brasileiros chegam a considerá-las como uma ofensa direta à sua cultura futebolística.
"Nunca houve, em tempo algum, na seleção um jogador que não pudesse ser substituído. A melhor prova disso é o mito Pelé. Quando ele encerrou a sua carreira, o Brasil continuou a ganhar jogos e títulos".
"Para mim o que conta é qualidade em compromisso com objetividade. Não me venham com a tagarelice de jogo bonito, pois isso não passa de filosofia". Assim fala Dunga.
Seus críticos dizem que ele roubou a alma, a beleza, o espetacular da seleção.
Durante a sua preparação, a seleção foi treinar em Curitiba. Os antecessores de Dunga sempre treinaram nas imediações do Rio de Janeiro. Dunga quis treinar em Curitiba porque lá as instalações são as mais modernas.
Mesmo em Curitiba houve grandes manifestações de torcedores na porta de entrada do centro de treinamento de repúdio à Dunga por não poderem assistir
aos treinos.
Até aqui, Dunga não dá sinais de sentir a pressão. Após à derrota perante à arqui-rival Argentina na olimíadas, o presidente Lula declarou que nunca uma derrota o aborreceu tanto. "Essa vergonha é terrível" teria dito Lula.
Desde então, o relacionamento entre Lula e Dunga se distanciou.
Ao contrário de Dunga, Lula, o representante do partido dos trabalhadores, não perde nenhuma oportunidade de mostrar que ele também é povo. Ele adora ficar junto ao povo. Se ele pudesse concorrer a uma terceira reeleição, provavelmente 80% dos brasileiros votaria nele.
Déficit no ensino? Desinteresse quanto a questão do meio-ambiente? Altos índice de criminalidade? E daí?
Com ajuda de Lula, o Brasil está no caminho de se tornar a quinta maior economia do mundo. Ele faz os brasileiros sonharem. E é isso que conta.
Carlos Dunga diz que ele gostaria de trazer o seu país para junto da realidade. O Brasil quer ser campeão. Mas ele diz que o título não será conquistado com o "futebol samba". Importante são uma defesa bem organizada e estável, assim como disciplina.
Dunga trabalha de forma tão concentrada que parece ser o único a quem o barulho das vuvuzelas não incomoda. Tudo está organizado e cada passo ou exercício é analisado em profundidade.
Mauro Naves e seus colegas da TV Globo observam o treino da tribuna de imprensa. Segundo Naves, "na Globo estamos todos de acordo como deverá ser a manchete caso o Brasil seja eliminado": "Brasil eliminado por causa de Dunga".
Lá embaixo no campo, o treinador continua com o seu trabalho de valor. Ele não olha uma única vez para a tribuna dos repórteres.
Ele sabe que todos esperam pela sua demissão. Dunga tem certeza de que o seu posto só poderá ser mantido caso ganhe a copa na África do Sul.
"Na minha terra só o título conta; se eu não ganhar, terei que ir embora", diz ele.
Revista "Der Spiegel"
Cathrin Gilbert
Link do texto original em alemão:
http://www.spiegel.de/spiegel/0,1518,700337,00.html
Os torcedores, no entanto, acham que a sua seleção se afastou deles.
Pouco antes da partida para a África do Sul, acontece uma recepção no palácio presidencial para os jogadores da seleção nacional. Os jogadores ficam numa longa fila diante de Lula. Ele dá um aperto de mão e sussurra uma recomendação para cada um deles. Os flashes espoucam.
Se esta cena não se passasse na palácio presidencial, poderia-se imaginar o Papa dando a sua benção "Urbi et Orbi".
E, de repente, o rosto de Lula se torna sisudo. O treinador Dunga fica em pé a um metro do presidente e lhe estende a mão. Dunga, 46 anos, não aprecia intimidade e muito menos compromissos oficiais como esse, principalmente quando esses compromissos são determinados apenas dois dias antes e, com isso, atrapalham totalmente os planos de treinamento. Dunga também não se simpatiza muito com políticos, pois eles "apenas falam aquilo que as pessoas querem ouvir", diz ele.
A seleção se qualificou de forma soberana para o mundial na África do Sul, ganhou a Copa das Confederações, se preparou muito bem e não há contundidos no time.
Apesar disso, o ânimo da pátria está ofuscado. Os torcedores não acreditam muito que os heróis venham a trazer a taça.
Não tem nada a ver com a qualidade do plantel. A seleção se compõem de 23 jogadores altamente técnicos. No entanto, o povo não se sente ligado a essa seleção. O time foi um dos primeiros a chegar na África do Sul. Dunga os isolou o quanto foi possível. Ele não quer que a ocasião se transforme num circo, como o foi em copas anteriores, nas quais repórteres e torcedores passeavam folgadamente no local de treinamento sempre que quisessem.
Os seus críticos mais ferozes estão hospedados num hotel perto do centro esportivo. A TV Globo, o gigante da mídia brasileira, enviou um exército completo de repórteres para a África do Sul. A Globo é uma alta potência no Brasil, com TV, jornal e portais na Internet. Duas coisas são básicas aos brasileiros além do futebol: a família e a televisão. A Globo, com sua telenovelas, shows e reportagens esportivas, decide e determina quando o povo deve sorrir ou chorar. Alguns repórteres são tão famosos em sua pátria quanto Pelé ou Gisele Bündchen.
O treinador que tiver a Globo como inimiga, terá uma vida muito difícil como técnico da seleção.
Mauro Neves não precisou pensar muito para informar porque os brasileiros não amam esse time. "É tudo culpa do treinador" diz o repórter da TV Globo. Os colegas concordam com a cabeça. Eles chamam Dunga de "o alemão" porque ele sempre é muito correto, planeja tudo, não suporta bajulação e barra a mídia. "Ele não gosta de nós, o alemão, ele não gosta de ninguém", diz Naves.
Carlos Dunga se chama na verdade Carlos Caetano Bledorn Verri. Ele ganhou o apelido de "Dunga" porque, quando criança, era muito pequeno. Seus avós vieram da Alemanha.
Ele era capitão da seleção em 1994, quando ganhou a copa. Dunga foi o "destruidor e limpador" na defesa, jogando sempre de forma objetiva. Também jogou durante dois anos na liga alemã pelo Stutgart.
O jogo da seleção atual, sob o comando de Dunga, não é mais tão ofensivo como antigamente. Sob o seu comando a seleção joga de forma controlada, eficiente e, poderíamos até dizer, de forma moderna. Ídolos como Ronaldinho, Ronaldo e Roberto Carlos foram descartados do plantel. O único que ainda ficou é Kaká, do Real Madrid.
Os torcedores estão decepcionados. Eles queriam ver seus antigos heróis jogar. Os protestos contra a reforma de Dunga aumentaram principalmente depois que ele barrou Adriano, um dos jogadores mais apreciados no Brasil
Dunga fecha os olhos e diz: "Eu não estou aqui para agradar quem quer que seja. No Brasil o futebol é amor. E o amor transita entre o ódio e a paixão".
Há dois anos, o jornal "O Globo" pediu a demissão de Dunga por ter perdido a semifinal olímpica contra a Argentina. Nas suas caricaturas, o jornal colocou um aviso: "Pede-se não enviar flores".
Dunga sobreviveu a isso, contando com apoio da CBF. E agora é a Copa do Mundo.
Não há espaço para perdão.
Dunga se considera um reformador. Às vezes ele formula frases que são tão francas e claras em sí, que os brasileiros chegam a considerá-las como uma ofensa direta à sua cultura futebolística.
"Nunca houve, em tempo algum, na seleção um jogador que não pudesse ser substituído. A melhor prova disso é o mito Pelé. Quando ele encerrou a sua carreira, o Brasil continuou a ganhar jogos e títulos".
"Para mim o que conta é qualidade em compromisso com objetividade. Não me venham com a tagarelice de jogo bonito, pois isso não passa de filosofia". Assim fala Dunga.
Seus críticos dizem que ele roubou a alma, a beleza, o espetacular da seleção.
Durante a sua preparação, a seleção foi treinar em Curitiba. Os antecessores de Dunga sempre treinaram nas imediações do Rio de Janeiro. Dunga quis treinar em Curitiba porque lá as instalações são as mais modernas.
Mesmo em Curitiba houve grandes manifestações de torcedores na porta de entrada do centro de treinamento de repúdio à Dunga por não poderem assistir
aos treinos.
Até aqui, Dunga não dá sinais de sentir a pressão. Após à derrota perante à arqui-rival Argentina na olimíadas, o presidente Lula declarou que nunca uma derrota o aborreceu tanto. "Essa vergonha é terrível" teria dito Lula.
Desde então, o relacionamento entre Lula e Dunga se distanciou.
Ao contrário de Dunga, Lula, o representante do partido dos trabalhadores, não perde nenhuma oportunidade de mostrar que ele também é povo. Ele adora ficar junto ao povo. Se ele pudesse concorrer a uma terceira reeleição, provavelmente 80% dos brasileiros votaria nele.
Déficit no ensino? Desinteresse quanto a questão do meio-ambiente? Altos índice de criminalidade? E daí?
Com ajuda de Lula, o Brasil está no caminho de se tornar a quinta maior economia do mundo. Ele faz os brasileiros sonharem. E é isso que conta.
Carlos Dunga diz que ele gostaria de trazer o seu país para junto da realidade. O Brasil quer ser campeão. Mas ele diz que o título não será conquistado com o "futebol samba". Importante são uma defesa bem organizada e estável, assim como disciplina.
Dunga trabalha de forma tão concentrada que parece ser o único a quem o barulho das vuvuzelas não incomoda. Tudo está organizado e cada passo ou exercício é analisado em profundidade.
Mauro Naves e seus colegas da TV Globo observam o treino da tribuna de imprensa. Segundo Naves, "na Globo estamos todos de acordo como deverá ser a manchete caso o Brasil seja eliminado": "Brasil eliminado por causa de Dunga".
Lá embaixo no campo, o treinador continua com o seu trabalho de valor. Ele não olha uma única vez para a tribuna dos repórteres.
Ele sabe que todos esperam pela sua demissão. Dunga tem certeza de que o seu posto só poderá ser mantido caso ganhe a copa na África do Sul.
"Na minha terra só o título conta; se eu não ganhar, terei que ir embora", diz ele.
Revista "Der Spiegel"
Cathrin Gilbert
Link do texto original em alemão:
http://www.spiegel.de/spiegel/0,1518,700337,00.html
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